sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Leiturinha Obrigatória: Dez chamamentos ao amigo - VIII

VIII
De luas, desatino e aguaceiro
Todas as noites que não foram tuas.
Amigos e meninos de ternura
Intocado meu rosto-pensamento
Intocado meu corpo e tão mais triste
Sempre à procura do teu corpo exato.
Livra-me de ti. Que eu reconstrua
Meus pequenos amores. A ciência
De me deixar amar
Sem amargura. E que me dêem
Enorme incoerência
De desamar, amando. E te lembrando
- Fazedor de desgosto -
Que eu te esqueça.
(Hilda Hilst)




segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

O Lobo Mau - Um famoso Psicopata

Lendo o meu divertido livrinho O Lobo Mau no Divã (veja aqui), o capítulo que descreve a Psicopatia dá como exemplo o famosíssimo Lobo Mau, velho conhecido de todos nós. O dissimulado Lobo matou dois dos três porquinhos e depois conseguiu enganar a ingênua Chapeuzinho Vermelho, mostrando-se bondoso e acolhedor, usando uma fantasia de vovozinha (a verdadeira avó de Chapeuzinho também foi assassinada pelo sádico). Contos infantis?? Sim, claro. Porém, há inúmeros psicopatas soltos pelo mundo afora, mentindo, enganando, roubando, e, claro, matando vítimas indefesas e crédulas. Veja a descrição que o livro dá a respeito do grande vilão sem caráter:

Psicopatia - Os Fatos
A palavra "psicopata" geralmente é mal empregada. Algumas vezes, é usada para descrever indivíduos dominados pela psicose, enquanto em outras ocasiões é empregada para descrever de modo genérico um assassino. Evidentemente, nem todos os indivíduos com traços psicopáticos chegam a matar, mas todos carecem de empatia e não têm nenhum sentimento de remorso quando seus atos são prejudiciais aos outros.
É importante ressaltar que nem todos os psicopatas representam um risco físico. Entretanto, é comum que aqueles que iniciam um relacionamento com uma pessoas com traços psicopáticos saiam emocionalmente abalados da experiência. A psicopatia é um distúrbio muito difícil de tratar, já que geralmente o paciente não admitirá - nem mesmo para si - que existe um problema.
No caso do Lobo Mau, a psicopatia é nitidamente perigosa e acabou resultando em morte. A maior parte dos assassinos mata apenas uma vez e por muitas razões diferentes, enquanto os assassinos em série - como o Lobo Mau e o Barba Azul - vão adquirir um gosto pelo assassinato, e sua paixão por isso vai aumentar gradativamente. Conhecemos três vítimas do Lobo, mas pode haver muitas mais. Observe-se, também, como os assassinatos progrediram para dois por dia, com a matança dos porquinhos. Também é comum que um psicopata assassino tenha um período de "resfriamento" em meio à profusão de homicídios - como é o caso do Lobo - e, então, parta para uma nova área.

Como não ser vítima de um psicopata
Use esta lista para saber se você conhece algum psicopata como o Lobo Mau. Essa pessoa em questão...
(   ) Não demonstra empatia?
(   ) Tem uma opinião elevada a respeito de si mesmo?
(   ) Mente de maneira contínua e sem remorsos?
(   ) Se comporta de maneira calculista e manipuladora?
(   ) Se comporta impulsivamente e parece incapaz de "pisar no freio" depois de estimulado?
(   ) Tem um estilo de vida parasítico, provavelmente solitário?
(   ) Infringe a lei?
(   ) Recusa-se a assumir a responsabilidade por seus atos?
(   ) É aparentemente amigável e capaz de mostrar-se sedutor?
(   ) Parece incapaz de tolerar aborrecimentos?
(Trecho retirado do livro O Lobo Mau no Divã)

Vale a pena ressaltar que os psicopatas não são pessoas sujas, mal arrumadas, com má aparência. São pessoas normais, e muitas vezes se mostram amigáveis, simpáticas, calorosas e gentis quando o intuito é conquistar a confiança de suas vítimas. Preste atenção, eles são muito amáveis quando querem. Fique com as orelhas em pé com pessoas que não têm amigos, que têm dificuldades sociais, que se dizem maltratadas, excluídas, que gostam de fazer drama e que têm facilidade extrema para a prática da mentira. Palavras doces também são um grande trunfo desses doentes, eles têm uma lábia irresistível. São mestres na arte do engodo. Quando você menos perceber sua vida estará transformada em um inferno e você estará isolado de todos os seus amigos e familiares. Cuidado!
Os Psicopatas mentem de maneira cruel e deslavada, preste redobrada atenção em pessoas mentirosas!



domingo, 25 de dezembro de 2011

Eu aprendi

EU APRENDI
que a melhor sala de aula do mundo
está aos pés de uma pessoa mais velha;
EU APRENDI
que ser gentil é mais importante do que estar certo;
EU APRENDI
que eu sempre posso fazer uma prece por alguém
quando não tenho a força para
ajudá-lo de alguma outra forma;
EU APRENDI
que não importa quanta seriedade a vida exija de você,
cada um de nós precisa de um amigo
brincalhão para se divertir junto;
EU APRENDI
que algumas vezes tudo o que precisamos
é de uma mão para segurar
e um coração para nos entender;
EU APRENDI
que deveríamos ser gratos a Deus
por não nos dar tudo que lhe pedimos;
EU APRENDI
que dinheiro não compra "classe";
EU APRENDI
que são os pequenos acontecimentos
diários que tornam a vida espetacular;
EU APRENDI
que debaixo da "casca grossa" existe uma pessoa
que deseja ser apreciada,
compreendida e amada;
EU APRENDI
que Deus não fez tudo num só dia;
o que me faz pensar que eu possa?
EU APRENDI
que ignorar os fatos não os altera;
EU APRENDI
que o AMOR, e não o TEMPO,
é que cura todas as feridas;
EU APRENDI
que cada pessoa que a gente conhece
deve ser saudada com um sorriso;
EU APRENDI
que ninguém é perfeito
até que você se apaixone por essa pessoa;
EU APRENDI
que a vida é dura, mas eu sou mais ainda;
EU APRENDI
que as oportunidades nunca são perdidas;
alguém vai aproveitar as que você perdeu.
EU APRENDI
que quando o ancoradouro se torna amargo
a felicidade vai aportar em outro lugar;
EU APRENDI
que devemos sempre ter palavras doces e gentis
pois amanhã talvez tenhamos que engoli-las;
EU APRENDI
que um sorriso é a maneira mais barata
de melhorar sua aparência;
EU APRENDI
que todos querem viver no topo da montanha,
mas toda felicidade e crescimento
ocorre quando você esta escalando-a;
EU APRENDI
Que quanto menos tempo tenho,
mais coisas consigo fazer.
(William Shakespeare)




quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Narcisismo Situacional Adquirido - Subindo no Tijolo

Lendo o divertido livro O Lobo Mau no Divã (veja aqui), me deparei com um capítulo bastante interessante sobre o distúrbio mental que acomete a Rainha de Copas, do País das Maravilhas. Lembram-se dela? Ela era uma monarca cruel, sem noção, que mandava cortar a cabeça de todos aqueles que a desafiavam ou desobedeciam. Cometia injustiças a torto e a direito, sem se importar com as consequências de seus desejos descabidos.

O Narcisismo Situacional Adquirido é um distúrbio bastante comum, e aparece em pessoas que da noite para o dia conseguem obter uma situação de destaque perante os outros: pode ser que o indivíduo subiu de cargo, arrumou um emprego melhor, começou a namorar alguém importante, ficou rico de repente ou ficou famoso e em virtude disso passou a desprezar a companhia de seus amigos, sentindo-se superior a tudo e a todos. Resumindo, é o nosso conhecido caso que gerou a expressão "Subindo no Tijolo".



Veja o que li sobre o assunto:

Narcisismo Situacional Adquirido - Os Fatos
Embora muitos traços sejam semelhante aos do Transtorno de Personalidade Narcisista, cujas raízes estão na infância, o Narcisismo Situacional Adquirido aparece, principalmente, em indivíduos que se tornaram famosos, como um cantor ou uma estrela se cinema, ou que ocupam uma posição de poder, como um político ou o diretor de uma grande empresa. Também pode afetar os milionários.

Prognóstico
Indivíduos com esse transtorno apresentam, em especial, dificuldades para ajustar-se ao envelhecimento e à perda da antiga "superioridade". As relações interpessoais são geralmente prejudicadas devido aos problemas causados pelo senso de merecimento do indivíduo, sua necessidade de admiração e sua indiferença pelos sentimentos dos outros. Isso pode deixar a pessoa sem apoio quando relações significativas se rompem, o que, por sua vez, pode levar à depressão. É pouco provável que pessoas com este transtorno procurem tratamento. Se procurarem, no entanto, alguma melhora pode ser esperada.

Você deve ter sentido algo familiar lendo essa descrição, né? Isso acontece porque todo mundo conhece alguém que já "Subiu no Tijolo". Esse tipo de conduta é muito comum em empresas, e gera comentários e a indignação dos colegas. Quem nunca conheceu alguém que puxou o tapete dos outros, se apossou do cargo alheio e depois "Subiu no Tijolo"? rsrsrs
Temos também os exemplos de artistas que viram celebridades em pouco tempo e começam a ter um comportamento excêntrico e descabido, fazendo exigências e esgotando a paciência dos outros. É a famosa "Síndrome de Estrela".

O livro disponibiliza um questionário para facilitar o "diagnóstico":
Você já encontrou uma Rainha de Copas?
Alguém que você conhece sofre de delírios de grandeza?
A pessoa em questão...

(   ) Ficou muito famosa?
(   ) Adquiriu fortuna ou uma posição de poder?
(   ) Perdeu a habilidade de demonstrar empatia?
(   ) Começou a se comportar de uma forma grandiloquente e a apresentar uma vaidade exagerada?
(   ) Começou a se comportar de uma maneira que poderia ser descrita como destrutiva, escandalosa ou tola?
(   ) Tornou-se excessivamente autocentrada?
(   ) Mostrou necessidade de ouvir o quanto é maravilhosa?
(   ) Desconsiderou as normas sociais?
(   ) Pareceu acreditar em sua onipotência?
(   ) Cercou-se de pessoas que repetem a frase "sim, senhor"?
(   ) Entregou-se a comportamentos de risco?

Claro que um diagnóstico preciso só poderá ser feito por um profissional, mas essas dicas nos ajudam a identificar o comportamento do "metido" e a nos afastarmos de sua presença nefasta!
Ah! Outro detalhe:
Se se tratar de um ardiloso psicopata, ele subirá no tijolo, naturalmente, porém esconderá a ostentação atrás de uma máscara de humildade. Porém, o exibicionismo de bens materiais e o gosto por humilhar os subalternos aparecerão, uma vez ou outra, revelando o verdadeiro caráter do mentiroso.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Resenha: O Lobo Mau no Divã

Há algum tempo comprei um livro muito leve e divertido cuja leitura foi muuuito agradável: O Lobo Mau no Divã, de Laura James.



É uma leitura bem prazerosa, pois a autora fala dos distúrbios de alguns personagens das universais histórias infantis. Você sabia que o Lobo Mau é um experiente psicopata? E a Bela, de A Bela e Fera? Não é estranho ela conviver com aquele monstro? Tudo tem explicação: Ela é co-dependente e sofre de baixíssima autoestima, rs...

Cada capítulo descreve um personagem e oferece explanações sobre o distúrbio psicológico ligado a ele. Propõe também medidas de ajuda e até disponibiliza um questionário resumido para podermos identificar o mesmo padrão de comportamento nas pessoas que nos cercam.

Gostei bastante do livrinho! Claro que não é um tratado de Psicologia e um diagnóstico preciso só poderá ser feito por um profissional qualificado, mas achei a proposta bem interessante. Só não gostei muito do capítulo sobre Polyanna, afinal, eu também adoro fazer o Jogo do Contente, hehehe... Será que sofro de negação?? kkkkkk

Leia outros posts sobre O LOBO MAU NO DIVÃ:

* O Lobo Mau - Um famoso psicopata

* Narcisismo Situacional Adquirido - Subindo no tijolo

UPDATE!!! (25/01/2016)
Veja a resenha em vídeo:

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Assombros

Às vezes, pequenos grandes terremotos
ocorrem do lado esquerdo do meu peito.
Fora, não se dão conta os desatentos.
Entre a aorta e o omoplata rolam
alquebrados sentimentos.
Entre as vértebras e as costelas
há vários esmagamentos.
Os mais íntimos
já me viram remexendo escombros.
Em mim há algo imóvel e soterrado
em permanente assombro.
(Affonso Romano de Sant'Anna)









terça-feira, 13 de dezembro de 2011

A miragem

Não direi que a tua visão desapareceu dos meus olhos sem vida
nem que a tua presença se diluiu na névoa que veio.
Busquei inutilmente acorrentar-me a um passado de dores
Inutilmente.
Vieste - tua sombra sem carne me acompanha
Como o tédio da última volúpia.
Vieste - contigo um vago desejo de uma volta inútil
E contigo uma vaga saudade...
És qualquer coisa que ficará na minha vida sem termo
Como uma aflição para todas as minhas alegrias.
Tu és a agonia de todas as posses
És o frio de toda a nudez
E vã será toda a tentativa de me libertar da tua lembrança.

Mas quando cessar em mim todo o desejo de vida
E quando eu não for mais que o cansaço da minha caminhada pela areia
Eu sinto que me terás como me tinhas no passado -
Sinto que me virás oferecer a água mentirosa
Da miragem.
Talvez num ímpeto eu prefira colar a boca à areia estéril
Num desejo de aniquilamento.
Mas não. Embora sabendo que nunca alcançarei a tua imagem
Que estará suspensa e me prometerá água
Embora sabendo que tu és a que foge
Eu me arrastarei para os teus braços.
(Vinicius de Moraes)


domingo, 11 de dezembro de 2011

O Pequeno Príncipe e a Raposa

E foi então que apareceu a raposa:
- Bom dia, disse a raposa.
- Bom dia, respondeu polidamente o principezinho, que se voltou, mas não viu nada.
- Eu estou aqui, disse a voz, debaixo da macieira…
- Quem és tu? perguntou o principezinho. Tu és bem bonita…
- Sou uma raposa, disse a raposa.
- Vem brincar comigo, propôs o principezinho. Estou tão triste…
- Eu não posso brincar contigo, disse a raposa. Não me cativaram ainda.
- Ah! desculpa, disse o principezinho.
Após uma reflexão, acrescentou:
- Que quer dizer "cativar"?
- Tu não és daqui, disse a raposa. Que procuras?
- Procuro os homens, disse o principezinho. Que quer dizer "cativar"?
- Os homens, disse a raposa, têm fuzis e caçam. É bem incômodo! Criam galinhas também. É a única coisa interessante que fazem. Tu procuras galinhas?
- Não, disse o principezinho. Eu procuro amigos. Que quer dizer "cativar"?
- É uma coisa muito esquecida, disse a raposa. Significa "criar laços…"
- Criar laços?
- Exatamente, disse a raposa. Tu não és para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens também necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo…
- Começo a compreender, disse o principezinho. Existe uma flor… eu creio que ela me cativou…
- É possível, disse a raposa. Vê-se tanta coisa na Terra…
- Oh! não foi na Terra, disse o principezinho.
A raposa pareceu intrigada:
- Num outro planeta?
- Sim.
- Há caçadores nesse planeta?
- Não.
- Que bom! E galinhas?
- Também não.
- Nada é perfeito, suspirou a raposa.
Mas a raposa voltou à sua idéia.
- Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E por isso eu me aborreço um pouco. Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra. O teu me chamará para fora da toca, como se fosse música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos cor de ouro. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará lembrar-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo…
A raposa calou-se e considerou por muito tempo o príncipe:
- Por favor… cativa-me! disse ela.
- Bem quisera, disse o principezinho, mas eu não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer.
- A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens não têm mais tempo de conhecer alguma coisa. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me!
- Que é preciso fazer? perguntou o principezinho.
- É preciso ser paciente, respondeu a raposa. Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva. Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas, cada dia, te sentarás mais perto…
No dia seguinte o principezinho voltou.
- Teria sido melhor voltares à mesma hora, disse a raposa. Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração… É preciso ritos.
- Que é um rito? perguntou o principezinho.
- É uma coisa muito esquecida também, disse a raposa. É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias; uma hora, das outras horas. Os meus caçadores, por exemplo, possuem um rito. Dançam na quinta-feira com as moças da aldeia. A quinta-feira então é o dia maravilhoso! Vou passear até a vinha. Se os caçadores dançassem qualquer dia, os dias seriam todos iguais, e eu não teria férias!
Assim o principezinho cativou a raposa. Mas, quando chegou a hora da partida, a raposa disse:
- Ah! Eu vou chorar.
- A culpa é tua, disse o principezinho, eu não queria te fazer mal; mas tu quiseste que eu te cativasse…
- Quis, disse a raposa.
- Mas tu vais chorar! disse o principezinho.
- Vou, disse a raposa.
- Então, não sais lucrando nada!
- Eu lucro, disse a raposa, por causa da cor do trigo.
Depois ela acrescentou:
- Vai rever as rosas. Tu compreenderás que a tua é a única no mundo. Tu voltarás para me dizer adeus, e eu te farei presente de um segredo.
Foi o principezinho rever as rosas:
- Vós não sois absolutamente iguais à minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém ainda vos cativou, nem cativastes a ninguém. Sois como era a minha raposa. Era uma raposa igual a cem mil outras. Mas eu fiz dela um amigo. Ela á agora única no mundo.
E as rosas estavam desapontadas.
- Sois belas, mas vazias, disse ele ainda. Não se pode morrer por vós. Minha rosa, sem dúvida um transeunte qualquer pensaria que se parece convosco. Ela sozinha é, porém, mais importante que vós todas, pois foi a ela que eu reguei. Foi a ela que pus sob a redoma. Foi a ela que abriguei com o pára-vento. Foi dela que eu matei as larvas (exceto duas ou três por causa das borboletas). Foi a ela que eu escutei queixar-se ou gabar-se, ou mesmo calar-se algumas vezes. É a minha rosa.
E voltou, então, à raposa:
- Adeus, disse ele…
- Adeus, disse a raposa. Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.
- O essencial é invisível para os olhos, repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Foi o tempo que perdeste com tua rosa que fez tua rosa tão importante.
- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa… repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Os homens esqueceram essa verdade, disse a raposa. Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela rosa…
- Eu sou responsável pela minha rosa… repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
(Diálogo entre o principezinho e a raposa, capítulo XXI do livro O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry.)




quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Ria através dos olhos de um Músico

Hoje vi esse vídeo no Facebook de uma amiga e não resisti, tive que postar aqui pra vocês:


É minha homenagem aos meus queridos amigos MÚSICOS, hahahaha... Achei fantástico!!! 
(Não repara não, todo músico é meio biruta, mesmo... kkkkk)

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Soneto do amor total

Amo-te tanto meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.


Amo-te enfim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade 
Dentro da eternidade e a cada instante.


Amo-te como um bicho simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.


E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.
(Vinicius de Moraes)


sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Como criar um Delinquente

No mundo agitado e conectado em que vivemos, nos deparamos todos os dias com exemplos de jovens tiranos, insensíveis, egoístas e manipuladores. Ficamos sabendo de histórias de arrepiar os cabelos, não é mesmo? E então, vendo situações grotescas e inacreditáveis, nos perguntamos se o mundo tem ou não tem salvação. O que está errado? Por que a juventude está se tornando tão alienada e cruel?


 


O Departamento de Polícia de Houston, no Texas, elaborou uma lista enumerando algumas maneiras efetivas para se criar um delinquente. Veja:

1- Comece na infância a dar ao seu filho tudo o que ele quiser, assim, quando ele crescer, acreditará que o mundo tem obrigação de lhe dar tudo o que deseja;
2- Quando ele disser nomes feios, ache graça, isso o fará considerar-se importante e desconsiderar aos demais desde pequeno;
3- Nunca lhe dê orientação religiosa, espere até que tenha 21 anos e decida por si mesmo, a sociedade há de auxiliá-lo, mesmo que ele se torne um fanático e seja explorado financeiramente;
4- Apanhe tudo o que ele deixar jogado (roupas, livros, comida), faça tudo para que ele aprenda a jogar a responsabilidade dele sobre os outros;
5- Discuta com freqüência na frente dele, principalmente nos 7 primeiros anos, assim ele não ficará chocado quando o lar dele se desfizer mais tarde;
6- Dê-lhe todo o dinheiro que ele quiser, nunca o deixe ganhar seu próprio dinheiro, assim você o poupa de passar pelas mesmas dificuldades que você passou, mesmo quando ele acabar com todo o seu patrimônio;
7- Satisfaça todos os seus desejos de comida, bebida, conforto, afinal isto poderia acarretar frustrações prejudiciais, mesmo que ele fique obeso, com problemas na coluna, etc;
8- Tome o partido dele contra os vizinhos, professores, policiais, afinal ninguém tem o direito de educar seu filho, só a TV e a empregada;
9- Não o oriente quanto as amizades, mesmo que os parentes lhe avisem que parecem traficantes, e quando ele se meter em encrenca séria, dê a desculpa que nuca conseguiu dominá-lo;
10- Quando estiver em profundo desgosto com a vida, console-se, diga que é o seu destino e o dele, que Deus quis assim...

É triste ver que os jovens de hoje serão os adultos de amanhã, e que se as coisas continuarem como estão, em breve viveremos numa sociedade desumana. Claro que há exceções, mas há um grande trabalho educacional a ser feito. Educacional, sim: nós, os professores, somos parte desse processo. Só que educação começa EM CASA. A educação vem do berço. A função dos pais é EDUCAR seus filhos, não somente sustentá-los e dar-lhes dinheiro para que comprem tudo o que desejam. Professor NÃO É babá de criança mimada!!

Acalanto

Dorme, que eu penso.
Cada qual assim navega
pelo seu mar imenso.
Eatarás vendo. Eu estou cega.
Nem te vejo nem a mim.
No teu mar, talvez se chega.
Este, não tem fim.
Dorme, que eu penso.
Que eu penso neste navio
clarividente em que vais.
Mensagens tristes lhe envio.
Pensamentos - nada mais.
(Cecília Meireles)




quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Resenha: Tarde demais para esquecer

Ontem assisti a mais um clássico do cinema, um filme chamado Tarde demais para esquecer (An affair to remember, EUA, 1957) e fiquei encantada! É uma história de um amor intenso, porém impossível. Gostei bastante da trama e do desfecho também.



Veja a sinopse:
Nickie Ferrante (Cary Grant) é um playboy mulherengo, que é considerado o solteiro mais cobiçado da atualidade e está para se casar com Lois Clark (Neva Patterson). Terry McKay (Deborah Kerr) é uma ex-cantora que também está de casamento marcado, com Kenneth Bradley (Richard Denning). Ambos estão em um cruzeiro que parte da Europa rumo a Nova York, no qual se conhecem. Nickie e Terry se apaixonam mas, como ambos têm relacionamentos com outras pessoas, combinam de se encontrar 6 meses após a chegada da viagem, no alto do Empire State. Neste período eles poderão acertar suas vidas e, caso se reencontrem, se casar.



Adorei o filme, principalmente na cena em que Terry canta a singela canção "An affair to remember" em francês, com a avó de Nickie tocando piano:



Essa música é simplesmente maravilhosa!!!!!!!!!




E pensar que tem gente que não gosta dos clássicos...

domingo, 27 de novembro de 2011

Dez chamamentos ao amigo - X

X
Não é apenas um vago, modulado sentimento
O que me faz cantar enormemente
A memória de nós. É mais. É como um sopro
De fogo, é fraterno e leal, é ardoroso
É como se a despedida se fizesse o gozo
De saber
Que há no teu todo e no meu, um espaço
Oloroso, onde não vive o adeus.
Não é apenas vaidade de querer
Que aos cinquenta
Tua alma e teu corpo se enterneçam
Da graça, da justeza do poema. É mais.
E por isso perdoa todo esse amor de mim
E me perdoa de ti a indiferença.
(Hilda Hilst)


domingo, 20 de novembro de 2011

O Capoeira

— Qué apanhá sordado?
— O quê?
— Qué apanhá?
Pernas e cabeças na calçada.
(Oswald de Andrade)


sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Ode

Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda 
Brilha, porque alta vive.
(Ricardo Reis - Heterônimo de Fernando Pessoa)



terça-feira, 8 de novembro de 2011

Amor e Medo

Estou te amando e não percebo, 
porque, certo, tenho medo. 
Estou te amando, sim, concedo, 
mas te amando tanto 
que nem a mim mesmo 
revelo este segredo.
(Affonso Romano de Sant' Anna)




quinta-feira, 3 de novembro de 2011

As sem-razões do amor

Eu te amo porque te amo,
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.
Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.
Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.

(Carlos Drummond de Andrade)



domingo, 2 de outubro de 2011

Resenha: O Efeito Sombra

Li recentemente um livro muito bom chamado O Efeito Sombra. A obra foi escrita por três autores bastante famosos no campo da literatura holística, e é dividido em três partes:

- 1ª parte: A sombra coletiva, por Deepak Chopra;
- 2ª parte: Fazendo as pazes com os outros, com o mundo e consigo mesmo, por Debbie Ford;
- 3ª parte: Só a luz pode banir a escuridão, por Marianne Williamson.

As três partes se complementam, e confesso que gostei mais da 2ª parte. Vou compartilhar com vocês um trecho que me agradou bastante:

Nossa mente nos diz que o mal é mau, que o bem é bom, e que jamais poderemos ser tudo o que sonhamos, mas, se nossa sombra pudesse falar, ela nos diria o contrário. Ela nos diria que a luz mais radiante só pode brilhar quando tivermos aceitado a escuridão. Ela nos tranquilizaria de que há sabedoria em cada ferimento. Mostraria-nos que a vida é uma jornada mágica para fazer as pazes tanto com nossa humanidade quanto com nossa divindade. A sombra nos diria que merecemos mais, que somos importantes, que somos mais do que poderíamos sonhar e que há luz no fim do túnel.
Ao abraçar a sombra, descobrimos que estamos vivendo em um plano divino, tão importante e tão vital para a evolução quanto para a evolução da humanidade. Assim como uma flor de lótus nasce na lama, precisamos honrar as partes mais sombrias de nós mesmos, e as nossas experiências de vida mais dolorosas, pois são elas que nos permitem o nascimento do mais belo self. Precisamos do passado turbulento e enlameado, da sujeira da vida humana - da combinação de cada mágoa, ferimento, perda e desejo não realizado, misturada a cada alegria, sucesso e bênção, para nos dar sabedoria, perspectiva, e nos conduzir a ingressar na mais magnífica expressão de nós mesmos. Essa é a dádiva da sombra.
(Debbie Ford)


Todos nós pensamos que devemos ser puros e imaculados em pensamentos e ações o tempo todo, né? Só que a obsessão por uma conduta espartana acaba gerando neuroses incontáveis em nossa vida. Quem não conhece aquela pessoa presa, estressada, insegura, que vive se punindo pelo menor erro?
Errar faz parte da experiência humana, assim como sentir raiva, medo, ser espontâneo e verdadeiro em seus sentimentos. Ninguém é politicamente correto o tempo todo, isso é impossível! É exatamente disso que esse livro fala, sobre aceitar nossa parte imperfeita e lidar com ela da melhor forma possível, antes que ela nos sabote e nos atrapalhe de fato.

Para saber mais sobre a sombra, pesquise e leia sobre a obra de Carl Jung. O Bem e o Mal fazem parte da gente, não adianta querer dar uma de santo. Todo mundo tem seus defeitos, e ainda bem que é assim! O mundo seria um tédio gigantesco se todos fossem super bonzinhos e perfeitinhos o tempo todo, não é mesmo?

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

A hora certa de desistir

Será que vale a pena lutar por algo que visivelmente não vai dar certo?

Bem, vamos analisar primeiro o que é perseverar e o que é desistir.
Perseverar é acreditar muito que uma coisa vai dar certo. É insistir, lutar, fazer de tudo para que uma situação melhore ou para que um projeto dê certo. As pessoas guerreiras, determinadas, insistem muito para ver seus objetivos acontecendo. Mesmo com milhões de empecilhos, o perseverante continua sua batalha até o fim.
Desistir é largar mão de uma coisa, sem culpa nem arrependimentos. É quando a gente olha uma situação e pensa: "É, não tem mais jeito mesmo..." Desistir é jogar a toalha na lona, é recuar e focar nossa energia em algo mais promissor.

Temos uma cultura onde as pessoas sofridas, guerreiras e batalhadoras são muito valorizadas. As coisas estão mudando um pouco, mas geralmente quem sofre e se sacrifica é visto como um herói. Todos aplaudem aquela pessoa que se mata de trabalhar, que apanha do marido durante 30 anos mas não desmancha o casamento, que passa necessidades mas não pensa em mudar de emprego ou de ramo. E o mártir, o "guerreiro" da situação, comumente se sente orgulhoso por apanhar tanto da vida. Mostra suas feridas e cicatrizes com orgulho, com carinho. Será que isso é certo?

Lutar por um objetivo plausível, ser determinado e decidido são características fenomenais em qualquer pessoa. Tudo o que fizermos na vida terá suas dificuldades peculiares, e um pouco de perseverança e esperança é altamente saudável. Uma pessoa que desiste facilmente é fraca, inconstante, e vai passar toda uma existência pulando de galho em galho sem construir nada de produtivo. Porém, ser cabeça dura e não saber desistir de projetos falidos é sinal de burrice, teimosia e ignorância. Tudo tem um limite. Se você já se esforçou, já deu o melhor de si, já se empenhou em uma causa ou projeto e não teve o resultado esperado, simplesmente desista! Gastar tempo e energia em algo que não é pra você é um enorme engano. Seja realista, enxergue as coisas como elas são, pare de querer ser um super herói. Na vida, existem coisas que dão certo, e existem coisas que não dão. Ponto. Você não será um fracassado se desistir de algo que está lhe consumindo. Lembre-se: VOCÊ vem em primeiro lugar, não se importe com o que os outros vão dizer. Cada um sabe onde lhe aperta o sapato, não é mesmo? Pense no seu bem estar, não na opinião do povo!



Quando falamos em esperança, perseverança e conquistas, pensamos também em relacionamentos pessoais. Existem indivíduos que insistem obsessivamente em manter uma relação que já acabou faz tempo. Ou então querem conquistar alguém totalmente diferente de si. Minha gente, não adianta, ninguém muda ninguém! Claro que no começo do relacionamento o outro pode fingir ter qualidades que você aprecia somente com o intuito de ser aceito, mas não existe mentira que dure pra sempre. Cada um é o que é e não muda, de jeito nenhum. Manter um relacionamento falido só por medo da solidão é uma tremenda bobagem, o mundo está cheio de gente legal e do bem. Pare de gastar energia com pessoas que não valem a pena!


As gerações anteriores tinham esse negócio de fazer as coisas durarem para sempre. Os eletrodomésticos eram eternos, e era uma honra se aposentar no primeiro emprego, trabalhar 40 anos na mesma empresa! Manter um casamento por mais de 30 anos então, oh! que maravilha! (mesmo com adultério, violência, falta de respeito e de amor). Hoje em dia o mundo mudou, nossa geração entende que as aparências não importam tanto assim, e se você tiver 3 geladeiras durante a vida não estará cometendo nenhuma heresia. As coisas podem dar certo ou não, e você não deve ficar se culpando por causa disso. As coisas não são eternas, o mundo anda pra frente!

Quando algo está muito enrolado, desista. Principalmente se o assunto for relacionamentos pessoais. Tenha a consciência de que você não vai mudar ninguém, e pare de querer ser Deus. A gente faz o que dá pra fazer, e, se não deu certo, paciência! Só não se condene a viver ao lado de uma pessoa que não está nem aí pra você, que não se esforça nem um pouquinho pra te agradar, que vive exigindo, pedindo, cobrando, enfim, podando o seu jeito de ser. Não se machuque para manter um relacionamento. Respeite-se! Tenha amor por si mesmo!



Lembre-se:
* Ninguém muda ninguém. Conforme-se e pare de se iludir achando que você tem o poder de mudar o outro;
* Tem coisas que não são para nós. Quando a situação é muito enrolada, caia fora;
* As coisas podem dar certo, ou não. Desistir não é sinal de fracasso, mas sim de inteligência e amor próprio;
* Não fique com alguém insuportável só para não ficar sozinho. Você merece mais, não se contente com menos!




domingo, 4 de setembro de 2011

O canalha (Nelson Rodrigues)

Quando soube que a noiva tinha viajado de lotação com o Dudu, sentada no mesmo banco, pôs as mãos na cabeça:
- Com o Dudu?
E ela:
- Com o Dudu, sim.
As duas mãos enfiadas nos bolsos, andando de um lado pa­ra outro, ele estaca, finalmente, diante da pequena:
- Olha, Cleonice, vou te pedir um favor de mãe pra fi­lho. Pode ser?
- Claro.
Puxa um cigarro:
- É o seguinte: de hoje em diante, ouviu?, de hoje em diante, tu vais negar o cumprimento ao Dudu.
Admirou-se:
- Por que, meu anjo?
Ele explicou:
- Porque o Dudu é um cínico, um crápula, um canalha abjeto. Um sujeito que não respeita nem poste e que é capaz até de dar em cima de uma cunhada. O simples cumprimento de Dudu basta para contaminar uma mulher. Percebeste?
- Percebi.
Ainda excitado, ele enxuga com o lenço o suor da testa:
- Pois é.
Passou. Mas a verdade é que Cleonice ficou impressionadíssima. Dava-se com o Dudu, sem intimidade, mas cordialmen­te. Dançara com ele umas duas ou três vezes. Mas como o Du­du fosse fisicamente simpático e educadíssimo, Cleonice guar­dara dos seus contatos acidentais uma boa impressão. Caiu das nuvens ao saber que ele era capaz de "dar em cima de uma cunhada". Teria, porém, esquecido. Voltando à carga, sentado com a noiva num banco de jardim público, ele começa:
- Meu anjo, tu sabes que eu não tenho ciúmes. Não sabes?
- Sei.
Pigarreia:
- Só tenho ciúmes de uma pessoa: o Dudu. E nunca te es­queças: é um canalha, talvez o único canalha vivo do Brasil. To­do mundo tem defeitos e qualidades. Mas o Dudu só tem defeitos.
Inexperiente da vida e dos homens, ela fazia espanto:
- Mas isso é verdade? Batata?
Exagerou:
- Batatíssima! Quero ser mico de circo se estou mentin­do! - E repetia, num furor terrível e inofensivo: - Indigno de entrar numa casa de família!

OBSESSÃO

Então, sem querer, sem sentir, Lima foi fazendo do Dudu o grande e absorvente personagem de suas conversas. Argumen­tava:
- Você é muito boba, muito inocente, nunca teve outro namorado senão eu. Queres um exemplo? Sou teu noivo, vou casar contigo. Muito bem. O que é que houve entre nós dois? Uns beijinhos, só. É ou não é?
Impressionada, admitiu:
- Lógico!
Lima continua:
- Figuremos a seguinte hipótese: que, em vez de mim, fos­se teu namorado o Dudu. Tu pensas que ele ia te respeitar co­mo eu te respeito? Duvido! Duvido! Dudu não tem sentimento de família, de nada! É uma besta-fera, uma hiena, um chacal!
Crispando-se, Cleonice suspira: "Parece impossível que existam homens assim". Lima prossegue: "Vou te dizer uma coi­sa mais: o Dudu olha para uma mulher como se a despisse men­talmente!".

A FESTA

Dias depois, Cleonice está conversando com umas coleguinhas quando alguém fala do Dudu. Então, ela olha para os lados e baixa a voz: "Ouvi dizer que o Dudu deu em cima de uma cunhada!". Uma das presentes, que conhecia o rapaz, a família do rapaz, protesta: "Mas o Dudu nem tem cunhada!". Mais tar­de a espantadíssima Cleonice interpela o Lima. Ele não se dá por achado:
- Eu não disse que o Dudu deu em cima de uma cunha­da. Eu disse que "daria" caso tivesse. Você entendeu mal.
Mais alguns dias e os dois vão a uma festa, em casa de famí­lia. Entram e têm, imediatamente, o choque: Dudu estava lá! Jun­to de uma janela, com o seu bonito perfil, fumando de piteira, pálido e fatal, atraía todas as atenções. Lima aperta o braço da noiva. Diz, entredentes: "Vamos embora". Ela, espantada, per­gunta: "Por quê?". O noivo a arrasta:
- O Dudu está aí. E não convém, ouviu? Não convém! Imagina se ele tem o atrevimento de te tirar para dançar. Deus me livre!

O MEDO

Na volta da festa, Cleonice faz, pela primeira vez, um co­mentário irritado:
- Fala menos nesse Dudu! Sabe que eu só penso nele? Te digo mais: tenho medo!
Lima estaca: "Medo de que e por que, ora essa?". Ela pare­ce confusa:
- Essas coisas impressionam uma mulher. - E repete o apelo: - Não fala mais nesse cara! É um favor que te peço!
Ele obstinou-se: "Falo, sim, como não? Você precisa olhar o Dudu como um verme!". Cleonice suspirou:
- Você sabe o que faz!

ÓDIO

Corria o tempo. Todos os dias, o Lima aparecia com uma novidade: "Vi aquela besta com outra!". E se havia uma coisa que doesse nele, como uma ofensa pessoal, era a escandalosa sorte do "canalha" com as outras mulheres. Nos seus desaba­fos com a noiva, Lima exagerava: "Cheio de pequenas! Tem na­moradas em todos os bairros!". Um dia, explodiu:
- Vocês, mulheres, parece que gostam dos canalhas! Por exemplo: o meu caso. Sem falsa modéstia, sou um sujeito decente, respeitador e outros bichos. Pois bem. Não arranjava pe­quena nenhuma. Até hoje não compreendo como você gostou de mim, fez fé comigo e me preferiu ao Dudu. - Pausa e baixa a voz, na confissão envergonhada: - Porque o Dudu me tirou todas as outras namoradas, uma por uma.
Era essa, com efeito, a origem do seu ódio por Dudu, do despeito que o envenenava.

AS BODAS

Chega o dia do casamento. Poucos minutos antes da ceri­mônia civil, Lima, transfigurado, ainda diz ao ouvido da noiva: "O Dudu roubou todas as minhas pequenas, menos você!". Pois bem. Casam-se no civil e, mais tarde, no religioso. Quase à meia-noite, estão os dois sozinhos, face a face, no apartamento que seria a nova residência. Ele, nervosíssimo, baixa a voz e pede: "Um beijo!". Ela, porém, foge com o rosto: "Não!". Lima não entende. Cleonice continua:
- Falaste tanto e tão mal do Dudu que eu me apaixonei por ele. Eu não trairei o homem que eu amo nem com o meu marido.
Lima compreendeu que a perdera. Sem uma palavra deixa o quarto nupcial. De pijama e chinelos veio para a porta da rua. Senta-se no meio-fio e põe-se a chorar.
(Nelson Rodrigues) 






sexta-feira, 2 de setembro de 2011

O idiota e a moeda


Conta-se que numa cidade do interior um grupo de pessoas se divertia com o idiota da aldeia. Um pobre coitado, de pouca inteligência, vivia de pequenos biscates e esmolas.
Diariamente eles chamavam o idiota ao bar onde se reuniam e ofereciam a ele a escolha entre duas moedas: uma grande de 400 RÉIS e outra menor de 2.000 RÉIS. Ele sempre escolhia a menos valiosa, o que era motivo de risos para todos.
Certo dia, um dos membros do grupo chamou-o e lhe perguntou se ainda não havia percebido que a moeda maior valia menos.
- "Eu sei", respondeu o tolo. "Ela vale cinco vezes menos, mas no dia que eu escolher a outra, a brincadeira acaba e não vou mais ganhar minha moeda”.

Podem-se tirar várias conclusões dessa pequena narrativa.

A primeira: Quem parece idiota, nem sempre é.
A segunda: Quais eram os verdadeiros idiotas da história?
A terceira: Se você for ganancioso, acaba estragando sua fonte de renda.
Mas a conclusão mais interessante é: A percepção de que podemos estar bem, mesmo quando os outros não têm uma boa opinião a nosso respeito.
Portanto, o que importa não é o que pensam de nós, mas sim, quem realmente somos.
O maior prazer de um homem inteligente é bancar o idiota diante de um idiota que banca o inteligente.
Preocupe-se mais com sua consciência do que com sua reputação.
Porque sua consciência é o que você é, e sua reputação é o que os outros pensam de você. E o que os outros pensam... é problema deles.
(Autor desconhecido)