sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Dica de Filme: O segredo dos seus olhos

Um dos melhores filmes que vi nos últimos tempos foi o argentino O Segredo dos Seus Olhos, de 2009. Vários amigos e amigas me haviam recomendado o título, e quando assisti percebi que o filme é realmente excelente!

 


Sinopse

Benjamin Esposito (Ricardo Darín) se aposentou recentemente do cargo de oficial de justiça de um tribunal penal. Com bastante tempo livre, ele agora se dedica a escrever um livro. Benjamin usa sua experiência para contar uma história trágica, a qual foi testemunha em 1974. Na época o Departamento de Justiça onde trabalhava foi designado para investigar o estupro e consequente assassinato de uma bela jovem. É desta forma que Benjamin conhece Ricardo Morales (Pablo Rago), marido da falecida, a quem promete ajudar a encontrar o culpado. Para tanto ele conta com a ajuda de Pablo Sandoval (Guillermo Francella), seu grande amigo, e com Irene Menéndez Hastings (Soledad Villamil), sua chefe imediata, por quem nutre uma paixão secreta.







Gostei muito mesmo desse filme. Achei a atuação do elenco bastante expressiva, a trama é muito bem amarrada e o final foi surpreendente. Eu adoro enredos policiais e investigação de crimes, acho que sou uma detetive frustrada, hehehe. A história tem ritmo, em nenhum momento me senti entediada. O desfecho do "romance" entre Benjamin e Irene foi bastante realista e sensato. Muito bom mesmo, super recomendo!


Veja o trailler:





As frases que mais me chamaram a atenção nessa história foram:

“Não quero deixar passar tudo de novo. Como pode ser? Como é possível que não fiz nada? Há vinte e cinco anos que me pergunto e há vinte e cinco anos que respondo a mim mesmo: foi outra vida, já passou. Não pergunte, não pense. Não foi outra vida, foi esta. É esta. Agora que entendi tudo, como se faz para viver uma vida vazia? Como se faz para viver uma vida cheia de “nada”?” 

"Os estúpidos se conservam melhor fisicamente porque não são corroídos pela ansiedade existencial a qual as pessoas mais ou menos lúcidas se vêem submetidas."

"Um homem pode mudar tudo na sua vida, sua casa, sua família, seu emprego, seu Deus, mas não pode mudar sua paixão."

Pois é, é um filme que fala sobre paixão e vingança, mistério e questionamento sobre o sentido da vida. É uma história que merece ser vista, analisada e admirada. Fora o sotaque argentino, que é um charme à parte, né? Nota dez!

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

A Mulher das Bofetadas

Chegou atrasado no emprego. Tirava o paletó, quando o Carvalhinho veio avisar:
— Olha, telefonaram pra ti.

— Homem ou mulher?

— Mulher.
— Deixou recado?
— Não. Disse que telefonava depois. Arregaçando as mangas, bufou:
— ok! ok!
Uns dez minutos depois, estava pondo em ordem uns pa­péis, quando o telefone bate novamente. O contínuo, que aten­deu, berrou:
— Aristides!
Larga o serviço e apanha o telefone. Era uma voz feminina que, a princípio, não identificou. A pessoa perguntava: — “Não me conheces mais?”. Aristides, já impaciente, foi quase gros­seiro:
— Quer dizer quem fala? Estou ocupadíssimo e não posso perder tempo.
Há uma pausa e, finalmente, a voz responde:
— Sou Dorinha.
Aristides quase cai para trás, duro.
Dorinha era o seu amor jamais esquecido ou, melhor, a sua dor-de-cotovelo confessa e imortal. Que idade teria ela, no momento? Uns vinte e cinco anos. Tinham se namorado na adolescência. Por um motivo bobo, haviam brigado. E quan­do Aristides, devorado pela nostalgia, quis voltar, ela já estava apaixonada por um outro, o Gouveia. Durante uns seis meses, Aristides andou pensando, dia após dia, em meter uma bala na cabeça. Acabou renunciando ao suicídio, mas ficou-lhe, para sempre, o sofrimento surdo. Dorinha casara-se com o Gouveia, tinha dois filhos de Gouveia. E sempre que a via, acidentalmente, na rua, Aristides precisava tomar um pileque dantesco. E, súbi­to, ela telefona, a inesquecível, a insubstituível Dorinha! Ao im­pacto da surpresa, gagueja:
— Ah, como vai você?
— Bem. E você?
— Navegando.
E, então, Dorinha diz-lhe:
— Preciso muito falar contigo.
— Comigo? E quando?
— Já.
— Pois não. Estou às tuas ordens. — E, na sua ternura so­frida, pergunta: — Tu sabes que mandas em mim, não sabes?
Combinaram o encontro, para daí a vinte minutos, numa sorveteria da rua da Carioca.
Aristides largou o serviço, que estava atrasadíssimo, e correu para o elevador. Daí a dez minutos, estava no local. Encontrou-a mais linda, mais fresca do que nunca. Diante da mulher que nun­ca deixara de amar, não se conteve. Com o coração disparan­do, começou:
— Sou todo teu. Nunca deixei de te amar.
Tomando refresco, com canudinho, Dorinha vai falando:
— Eu preciso de um favor teu. Mas quero que prometas que não pensarás mal de mim.
O espanto do rapaz foi uma coisa sincera e profunda:
— Você acha que eu posso fazer má idéia de ti? Oh, Do­rinha!
Então, sem desfitá-lo, Dorinha disse:
— Meu marido partiu hoje, ao meio-dia, para São Paulo. De hoje para amanhã, eu sou uma espécie de solteira ou, então, de viúva. De qualquer maneira, uma mulher livre. Pensei em você, que merece toda a minha confiança e… Está compreendendo?
Numa confusão total, balbuciou:
— Mais ou menos.
E ela:
— Para falar português claro: — estou oferecendo a minha tarde. Leva-me!
Deslumbrado, exclama:
— Oh, Dorinha!
Ele pagou, trêmulo, a despesa.
Saem e, lá fora, Dorinha observa:
— Mas não devo me expor. Arranja um interior, sim?
Acontece que Aristides mantinha, de sociedade com um amigo, um apartamento em Botafogo. Cheio de escrúpulos, bai­xa a voz: — “Eu tenho um lugar, assim, assim, discretíssimo”. Dorinha interrompe: — “Ótimo!”. Tomam um táxi, que ia pas­sando. A caminho de Botafogo, a pequena começa:
— Você, naturalmente, está espantado e querendo uma ex­plicação.
Protesta, veemente:
— Explicação nenhuma! Basta o fato em si! Você está aqui, comigo, a meu lado, e não interessam os motivos, argumentos, nada!
Quando entraram, uns quinze minutos depois, no aparta­mento, Aristides não sabia o que dizer. Ainda uma vez, Dori­nha toma a iniciativa:
— Você não me beija?
Ofereceu-lhe a boca. Aristides experimentou uma espécie de vertigem. O primeiro beijo, depois de tanto tempo, foi uma dessas coisas que marcam para sempre. Em seguida, ele a carre­ga no colo, como uma noiva de fita de cinema. Uma hora e pou­co depois, já a noite entrara no apartamento e Dorinha estava diante do espelho, refazendo a pintura. Aristides veio, por trás, beijar-lhe os ombros nus; e suspira:
— Eu não sabia que gostavas tanto de mim!
Dorinha vira-se, com divertida surpresa:
— Mas eu não gosto de ti.
Atônito, pergunta:
— E isso que aconteceu entre nós? Não conta?
A pequena está de pé:
— Era a explicação que eu queria te dar e que tu recusaste. O meu marido, ontem, discutiu comigo e me deu uma bofeta­da. Estou aqui por causa da bofetada. Mas amo o meu marido e só meu marido.
Ele insiste, desesperado:
— Quer dizer que não vamos continuar?
Responde:
— Depende. Se meu marido me bater outra vez, já sabe: — eu telefono pra ti.
Sem uma palavra, na maior humilhação de sua vida, dei­xou-a partir.
Mas quando a porta fechou-se atrás da pequena, ele caiu, de joelhos, no meio do quarto, mergulhou o rosto nas mãos e soluçou como uma criança.
Durante uma semana, ele foi o ser mais humilhado e mais ofendido da Terra. Dizia de si para si: — “A cínica! A cínica!”. E pior é que era incapaz de sentir atração por qualquer outra mulher. Uns quinze dias depois, ele atende o telefone: — era ela. Perguntava, alegremente:
— Vamos lá, outra vez?
Foram. E, no apartamento, ela suspira:
— Imagina, deu-me outra bofetada.
Encontraram-se outras vezes, sempre em função de novas bofetadas. Até que, uma tarde, entre um beijo e outro, ela ex­clama:
— Os homens são muito burros!
— Por quê?
E Dorinha:
— Tu não percebeste que não houve bofetada nenhuma? Que meu marido não me esbofeteou nunca? E que eu te amo, te amo e te amo?

(Nelson Rodrigues)


sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Resenha: Toda Sua/Profundamente Sua/Para Sempre Sua

Recentemente li os três primeiros volumes da série erótica Crossfire, da autora americana Sylvia Day. Seguindo a linha do best-seller Cinquenta Tons de Cinza (veja a resenha aqui), a fórmula é: sexo+romance+dinheiro+luxo+viagens paradisíacas+alguns traumas de infância.



Bem, pra não ser injusta em meus comentários, vou dizer que a série Crossfire é bem melhor (na medida do possível) do que a historinha de Anastacia e Christian. Sim, Sylvia Day melhorou muito a fórmula criada por E.L. James. Gideon, nosso protagonista rico, lindo, sarado, tarado e possessivo, é um Christian Grey mais equilibrado, mais humano e mais carinhoso. Claro que os livros não são nenhum exemplo de Literatura e etc, isso a gente nem discute, mas como leitura de entretenimento tá bom demais. É o que eu sempre digo: má Literatura é melhor do que nenhuma! Se pelo menos esses livros despertarem em alguém o hábito da leitura, já fico feliz.

Mas vamos falar do enredo: Gideon é um milionário de 28 anos que sofreu abuso sexual na infância. Ele conhece Eva, uma publicitária patricinha recém-formada e ambos começam a transar loucamente. Eva também sofrera abuso sexual na infância, mas isso não parece ter causado nenhum trauma a ela (hahaha, pelo menos é o que parece nas cenas de sexo!). A história se baseia praticamente nisso, mas no segundo livro há um assassinato para encher linguiça. É só isso, nada mais.

Pelo menos as cenas de sexo são boas, e Gideon é legal nesse quesito (minha opinião, rs). O livro não tem forçadas de barra homéricas como em Cinquenta tons de cinza. É uma história boba, ideal pra ler quando se está numa crise de tédio. Pra quem gosta de historinhas para passar o tempo, é válido. Vamos ver o que os dois volumes finais trarão.
Aliás, pra quê 5 volumes? Ainda bem que baixei os livros da Internet e li no Kindle, eu JAMAIS  pagaria 30 contos em cada exemplar. É nessas horas que penso: "Viva a Tecnologia!" hahahaha

domingo, 6 de outubro de 2013

Religião não se discute?

Há alguns dias estive presente na festinha de aniversário de uma amiga minha e lá conheci dois jovens rapazes. Ambos eram bastante inteligentes e cultos e, contrariando todas as expectativas de conversas adequadas para o gênero festa, começamos a ter um belíssimo papo-cabeça sobre Religião. Eu, claro, adorei a conversa e pude perceber muitas coisas nessa pequena interação com os dois desconhecidos.

Um dos rapazes era fã de Esoterismo e doutrinas orientais em geral. O outro era ateu, totalmente mental e científico. E eu, hã, eu tô no meio das duas coisas, né? Não acredito 100% em nenhuma religião ou dogma mas também não duvido 100% de nenhuma delas. Claro que com a idade e as experiências punks que a vida nos traz vamos mudando de ideia aqui e ali, mas se eu for comparar meu nível de crença ao que eu tinha há 10 anos atrás, vish... sou quase uma cética!



É incrível como a busca por explicações sobre religião, a existência de Deus e a vida em geral pode abrir nossa cabeça e nos levar a lugares inacreditáveis. Posso falar por mim, pois desde que nasci já estive em tudo quanto é tipo de religião, templo, seita e afins que vocês possam imaginar. Minha mãe tinha sérios problemas de saúde, então, desde criança, fui ensinada a tentar todas as alternativas possíveis em busca de uma solução definitiva para as mazelas da vida. Como a doença da minha mãe nunca foi diagnosticada, corremos o mundo em busca de ajuda em todos os lugares possíveis. Quando digo todos, I mean TODOS MESMO! Já estive em igreja católica, igreja evangélica tradicional, igreja evangélica moderna, rosacruz, centro de candomblé, centro de umbanda, centro kardecista, seicho-no-ie, budismo, igreja messiânica, escolas esotéricas (muitas!), cabala, escolas mentalistas, escolas reikianas, enfim, everywhere. Até hoje só não fui no Santo Daime, mas confesso que tenho muita curiosidade de saber como é! rs

E o que ganhei com isso?
Bem, na minha opinião, olhar as religiões com a mente aberta fez toda a diferença na minha vida. Hoje em dia discuto a respeito do assunto tranquilamente, sem me sentir atacada em minhas crenças quando alguém apresenta um argumento convincente e, principalmente, sem sentir medo, culpa ou vergonha. Com um leque tão vasto de experiências filosóficas/religiosas, pude perceber que não existe verdade absoluta e que é saudável questionar, pensar, refletir, argumentar. Você não vai pro inferno se questionar os dogmas da sua religião. Deus não vai mandar uma bola de fogo ou uma nuvem de gafanhotos em cima da sua casa se você desobedecer as leis que os homens DIZEM serem ditadas pelo Todo-Poderoso. Nada de horrível vai acontecer com você se, por acaso, você perceber que não acredita em mais nada daquilo e pronto. Você é livre pra acreditar no que quiser!
As religiões em geral podem restringir muito a vida do indivíduo e podem ser um poderoso instrumento de controle e persuasão nas mãos do sistema, isso é evidente. Entretanto, elas também podem trazer muito conforto em horas difíceis. É óbvio que uma hora ou outra alguma desgraça vai acontecer na sua vida (Shit happens!) e aí você poderá se beneficiar com o conforto que uma crença religiosa pode proporcionar. Não sou contra, acho válido. Dependendo da situação, é mais aconselhável acreditar em algo e preservar nossa saúde mental do que entrar em surto ou depressão pra dar uma de durão. Sou contra a passividade, a alienação de uma vida inteira, a falta de questionamento, a aceitação conformista daquilo que colocaram em nossas cabeças. E como fugimos desse estado passivo e inanimado de vida? Discutindo religião, oras! Pesquisando, indo aos lugares, observando, aprendendo. Se você começar a pesquisar com a mente aberta, com olhar científico, vai perceber que todas as religiões têm mais ou menos a mesma mensagem. Vai notar muitos pontos em comum entre elas e poderá, então, escolher racionalmente a que melhor lhe agrada. Ou então não escolher nenhuma, como é o meu caso. Qual o problema? Nenhum! Nada de terrível vai lhe acontecer se você não tiver uma religião oficial para apresentar à sociedade como sendo sua escolha principal.

E as escolas de esoterismo?
Posso dizer que tenho uma vasta experiência nesse ramo também. Desde os 12 anos estudei muitas linhas de magia e esoterismo e afirmo: a cultura e o conhecimento que você obtém com esse tipo de estudo é impressionante. Estudei, por muitos anos, tarot, astrologia, runas, i-ching, búzios, numerologia, quiromancia, magia branca, magia natural, alta magia, magia cabalística. Aprendi muitas coisas? Certamente. Só de pensar que tive acesso às noções de Inconsciente Coletivo, Arquétipos e Sombra de Jung aos 13, 14 anos, nossa... chega a ser absurdo! Eu jamais teria acesso a essas informações por outras vias. Valeu muito a pena! Hoje em dia acredito nessas coisas? Pouco, muito pouco. Por quê? Porque a experiência e a própria continuação de meus estudos me levaram a concluir que isso tudo não é 100% correto ou verdadeiro. Tá vendo? Se eu nunca tivesse duvidado das minhas próprias convicções, não teria mudado de ideia e permaneceria anos e anos e anos com as mesmas ideias. Se você não pensar com a sua cabeça, alguém vai pensar por você e aí sim o negócio vai ficar feio. Você quer ser um fantoche ou um ser pensante? A escolha é sua!

Confesso que adorei discutir sobre religião com meus novos amigos. Tudo com muito respeito, com muita cautela. Temos que tomar muito cuidado com os fanáticos. Percebi, ao longo dos anos, que quanto menor a qualidade e o volume de informação e cultura de uma pessoa, mais fanática e vulnerável a críticas ela se torna. Se a pessoa tem um pouco mais de conhecimento, ela não vai se persignar e se ofender com um comentário seu. Aquele tipo de pessoa que faz cara de horror e chama  o nome de Deus ou Jesus quando ouve um argumento mais forte não serve para participar de um debate. Essas pessoas já estão com a mente feita, não vão se abrir para nenhuma informação nova. E sabe qual é o melhor tipo de interlocutor para um debate religioso? Aquele que não quer te catequizar nem te convencer de que a fé dele é a certa.

Conclusão: devemos discutir religião SIM! Esse tipo de discussão nos faz pensar, nos faz mudar de ideia (ou então reforçar nossas conclusões anteriores). Vale muito a pena e ninguém vai ser castigado por causa disso. Go ahead! Think for yourself!

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Você faria qualquer bobagem por amor?

Sem sombra de dúvida, nossas crenças moldam nosso comportamento. Mesmo quando não sabemos conscientemente quais crenças governam nossas vidas, acabamos manifestando comportamentos totalmente ligados às coisas em que acreditamos. As crenças geram nossos comportamentos e reações, não tem jeito. Portanto, se quisermos mudar algum comportamento insatisfatório ou negativo devemos, primeiro, mudar nossas crenças. Mas como fazemos isso?
  Em primeiro lugar, só conseguimos lidar racionalmente com aquilo que conhecemos. Para que o processo de mudança seja efetivo, devemos reconhecer e explicitar nossas crenças relacionadas a um assunto específico. Por exemplo: se sou uma pessoa muito romântica e sonhadora e, por isso, sempre sofro decepções amorosas, devo examinar as crenças que sustentam minha visão a respeito de amor, relacionamentos e afetividade. Se eu acredito que o Amor supera todas as barreiras, ficarei extremamente chateada se meu namorado não quiser vir me ver porque está chovendo muito lá fora. Parece bobagem? Pois não é. As crenças ficam armazenadas no nosso inconsciente e são registradas através da linguagem. Se acredito que o Amor supera TODAS as barreiras, uma chuvinha qualquer não deveria atrapalhar o meu namoro. Parece uma infantilidade, mas é bem assim que as coisas funcionam. Você nunca se pegou tendo comportamentos infantis e absurdos sem saber de onde vieram aquelas ideias tão irreais? Nunca se sentiu frustrado por estar tendo sentimentos que, racionalmente, parecem exagerados e caricatos? Pois é, eu também. Então, alterando crenças limitantes podemos manifestar comportamentos mais realistas, ajustados e maduros.
Para ilustrar o processo de ajustamento das crenças em relação ao Amor, vamos dar alguns exemplos e raciocinar sobre eles de maneira objetiva e equilibrada:

Crença: “O Amor supera tudo” ou “Quem ama, perdoa”
Você realmente acredita que o fato de amar alguém lhe traz a obrigação de aturar qualquer tipo de desmando, contrariedade, obstáculo ou abuso? Você acha que o Amor supera diferenças de raça, cor, classe social, mentalidade, nível de instrução, objetivos de vida ou preferências? Se você acha que sim, me desculpe, mas você está sendo ingênuo. Nos romances e nas novelas, os casais passam por mil e uma dificuldades e no final ficam juntos, vitoriosos e apaixonados. Geralmente, eles se casam depois de muitas contrariedades e são felizes para sempre. Você já considerou a hipótese de isso ser apenas uma expressão literária, nada mais? Quem, na sua vida real, você conhece que tenha passado por uma história semelhante, ou seja, que tenha sofrido muito, passado por milhares de perrengues e depois terminou super feliz com seu par, vencendo a tudo e todos? Olhe bem, não estamos falando da APARÊNCIA da felicidade, mas de uma felicidade real e palpável. Eu não conheço nenhum casal que tenha passado por problemas graves, brigas, desavenças, traições, barracos em geral e que tenha saído ileso dessas provações. A verdade é que relacionamentos se desgastam com o tempo, a convivência mostra escancaradamente que nós vimos o que quisemos ver no outro no princípio e, se as uniões perduram, é por interesses mútuos dos parceiros (geralmente interesses financeiros). Sendo assim, abra o olho para todo tipo de abusos. Não pense que seu parceiro vai mudar depois de cometer abusos contra você. Não aceite desaforos, ofensas, desprezo, migalhas. Aceite o fato de que as coisas têm começo, meio e fim e preserve sua dignidade. Não se rebaixe só para provar para si mesmo e para os outros que o Amor tudo aguenta, tudo suporta, tudo perdoa. Acreditar nisso é um passo para um processo doentio de co-dependência. Lembre-se: às vezes, perdoar uma infração grave é dar munição para o outro lhe enganar de novo e continuar aprontando por aí, afinal, sair ileso de uma transgressão é um incentivo quase irresistível para repeti-la.

Crença: “Fulano é minha Alma Gêmea” ou “Fulano é o amor da minha vida”.
Esse tipo de crença é muito, mas muito limitante. Acreditar que, no mundo todo, só existe UMA pessoa compatível com você é uma tremenda bobagem. Claro que você pode se dar super bem com diversas pessoas durante sua existência, afinal, existe muita gente boa no nosso planeta. Quanto maiores forem as afinidades, melhor você se dará com alguém, isso é óbvio. Mas decidir que somente FULANO pode te fazer feliz é pedir pra sofrer. E se o Fulano morrer? Você nunca mais será feliz com ninguém, nunca mais? Aceite o fato de que é possível amar muitas pessoas durante a vida e isso não diminui o amor que você sente ou sentiu por nenhuma delas. Isso é natural e saudável. Não se deixe levar por pensamentos religiosos criados a fim de dominar a mente do homem comum. De que adianta ficar casado com a mesma pessoa por 50 anos traindo, enganando, brigando e passando raiva?

Crença: “Nos apaixonamos à primeira vista, era nosso destino!”
Bom, se você pensar bem, chegará à conclusão de que ninguém se apaixona à primeira vista. Claro que você pode sentir uma atração ao conhecer alguém, pode se interessar pela pessoa, mas se apaixonar são outros quinhentos. Você mal conhece o outro, não tem quase nenhuma informação confiável a respeito, como pode se apaixonar? E outra: é evidente que o outro, nos primeiros contatos, vai mostrar somente suas qualidades e vantagens. Obviamente lhe tratará na palma da mão, se esforçando ao máximo para lhe agradar. Com o passar do tempo, porém, as máscaras caem e você vai percebendo onde entrou. Não dá para confiar em nossas impressões enquanto estamos sendo bombardeados por hormônios. Há casos, também, em que distorcemos nossa visão das coisas para suprir nossas carências do momento. Às vezes o outro nem é tão maravilhoso assim, e a gente tem a tendência a enxergar aquilo que queremos, distorcendo os fatos. Acontece. Quem nunca passou por  isso que atire a primeira pedra!



Romeu e Julieta



Se analisarmos bem, veremos que ainda estamos sendo bombardeados por pressupostos do Romantismo. Sim, é isso mesmo! Lembra do mal-do-século? Homens e mulheres se amavam loucamente, faziam qualquer sacrifício por amores platônicos, se matavam por pessoas que mal conheciam. Morriam de depressão, fugiam de casa, faziam todas as loucuras do universo por amor. Lembram de Iracema? Foi iludida e abandonada, depois morreu de desgosto. Inocência? Idem. E o trágico “Amor de Perdição”? Tem desgraça maior do que esse livro? Teresa foi pro convento e morreu de tuberculose. Simão morre de desgosto por causa da morte da amada e é jogado ao mar. Pra completar a palhaçada, Mariana, que era apaixonada por Simão, se joga ao mar para se juntar ao seu amado. Ah gente, pelo amor de Deus, né?

Pois é, se nos livros isso tudo parece ridículo, por que insistimos em repetir esses comportamentos doentios na vida real? Da próxima vez que você estiver prestes a fazer bobagens em nome do Amor, lembre-se dessas histórias. Leia Machado de Assis, leia Eça de Queirós, leia Nelson Rodrigues. Traga o Realismo para dentro da sua vida, seja corajoso e enxergue a vida como ela é. Sonhar é confortável, eu sei, mas sonhe mantendo os pés no chão. Afinal, finais totalmente felizes só existem em filmes, novelas e romances!

Dicas de livros e filmes:

Para arrotar coraçõezinhos e ver como você NÃO deve agir:
- Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco - de longe o livro que mais odiei na vida, depois de Memorial do Convento, do Saramago. Que historinha mais fajuta, que personagens emo, que saco de trama! Odiei com todas as minhas forças;
- Iracema, de José de Alencar - era óbvio que o português ia ficar com ela e abandoná-la em seguida, afinal, o que um ricão ia querer com uma índia? Dá raiva, muita raiva;
- Inocência, de Visconde de Taunay - repetindo a história de Iracema, Inocência foi abandonada e morreu de desgosto. Péssimo final;
- O amor nos tempos do cólera, de Gabriel García Marquéz - tenho uma tia que ama esse livro. Eu detesto! Imagina o cara ficar a vida toda esperando por uma única mulher? E depois ficaram juntos, velhos e acabados. Nosso protagonista mostra que tem autoestima zero;
- 50 tons de cinza, de E.L.James - péssimo, péssimo, péssimo. Onde já se viu passar a mensagem de que vale a pena aguentar tudo quanto é tipo de desaforo, abuso e agressão para fazer um homem mudar magicamente? É revoltante! (veja resenha aqui).


 Para pôr os pés no chão e ver como a vida funciona de verdade:
- A insustentável leveza do ser, de Milan Kundera - maravilhoso demais. Super realista e muito bem escrito. É o tipo de livro que você lê um capítulo e pensa uma tarde toda. Forte demais. Um dos meus favoritos for life;
- O primo Basílio, de Eça de Queiróz - os anos passam e eu continuo adorando a história de Jorge, Luisinha e Basílio. Luisinha, toda romântica, se ferrou no final, enquanto Basílio caçava suas novas vítimas na Europa. Muito bom;
- O Mulato, de Aluísio Azevedo - super atual, mostra o preconceito racial nos relacionamentos do modo como ainda acontece hoje em dia. A recuperação instantânea de Ana Rosa após o assassinato de Raimundo mostra bem como o ser humano é;
- A vida como ela é, de Nelson Rodrigues - um dos meus escritores favoritos, hoje e sempre. Amo demais Nelson Rodrigues. Todos os contos de A vida como ela é me ensinaram algo a respeito do ser humano. Leitura obrigatória para toda pessoa racional;
- Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis - Machado, meu amado! A ironia do defunto-autor dá voz a todo o Realismo desse carioca genial. Um livro cheio de referências, simplesmente demais! O engraçado é que Machado de Assis escreveu, anos antes de Brás Cubas, um livro nos moldes românticos, chamado Helena. Helena se ferrou também por ter acreditado num cara que a enganou e depois morreu porque tomou chuva (patético!). Lendo a obra, percebe-se nitidamente que Machado achava o romantismo uma bobagem sem tamanho. Brás Cubas é a cereja do bolo desse escritor, juntamente com Dom Casmurro;
- A rosa púrpura do Cairo, de Woody Allen - ahhh, Woody Allen! Esse filme é espetacular. Mostra nitidamente que finais felizes só acontecem no cinema. Recomendadíssimo!



Iracema - pintura de Antônio Parreiras


Se você quiser ler mais livros de cunho realista, devore Nietzsche, Robert Greene, Oscar Wilde. E lembre-se: NINGUÉM morre por amor. Não exagere, não dramatize, não dê showzinho. Keep cool!